Ministros de Estado não podem ser remunerados por participarem de conselhos de administração de estatais. Isso porque o artigo 39, parágrafo 4º, da Constituição Federal determina que os ministros devem ser “remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação ou outra espécie remuneratória”.
Esse é o entendimento do juiz federal Guilherme Gehlen Walcher, da 2ª Vara Federal de Passo Fundo (RS). E por causa dele 13 ministros e ex-ministros de Dilma Rousseff (foto)terão de abrir mão do dinheiro que recebem por participar de conselhos fiscais ou de administração de empresas públicas, de economia mista ou das quais o governo federal é acionista.
O caso foi levado à Justiça Federal pelo advogado da União Marcelo Roberto Zeni. Na condição de cidadão, e não membro da Advocacia Geral da União, ele ajuizou um ação popular questionando o acúmulo de remunerações por ministros do primeiro mandato de Dilma.
Zeni questiona o fato de ministros estarem em conselhos de empresas defendendo interesses privados ao mesmo em que ocupam cargos públicos. “Ainda que pudessem ser consideradas possíveis essas cumulações, indaga-se: seriam elas morais? Não haveria uma incompatibilidade entre os 'cargos'? Não seria uma latente burla ao teto constitucional?”, questiona o autor.
Entre os ministros estão o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, que participa dos conselhos da BrasilCap e BrasilPrev e recebe R$ 6,6 mil por cada um, e a ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior, que é membro do conselho da Petrobras, da BR Distribuidora (subsidiária da Petrobras para distribuição de combustível) e do BNDES. Ela recebe R$ 8,2 mil pela BR Distribuidora e outros R$ 8,2 mil pela Petrobras.
O ex-ministro da Defesa Celso Amorim, que recebe R$ 19,1 mil por estar no conselho da Usina de Itaipu, também está na lista. Assim como o atual governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, que foi ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Ele está no conselho da holding do BNDES, a BNDESPAR, pelo que recebe R$ 16,1 mil. Por estar no conselho do BNDES, não é remunerado, assim como Miriam Belchior.
Alguns dos ministros, como Adams, Celso Amorim e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, vieram da gestão de Lula. Mantega participou dos conselhos da Petrobras e da BR Distribuidora e recebia R$ 8,2 mil de uma das empresas.
Teto remuneratório
A prática de oferecer a um ministro Estado num conselho de administração de empresa pública é prática comum. É uma forma de aumentar o salário de uma pessoa importante para a administração pública, conhecida por “jeton”.
Para o Ministério Público Federal, o pagamento de jeton é uma forma de burlar o teto da remuneração do serviço público — que a Constituição estabelece ser o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal. “Não são necessárias maiores digressões para concluir pela imoralidade da utilização do pagamento de jetons para burlar a norma constitucional”, diz o parecer do MP.
Mas o juiz Guilherme Walcher apenas tangencia essa discussão. Para ele, se a Constituição não permite a funcionários públicos acumular remunerações por meio do acúmulo de cargos, não faz diferença se o salário ultrapassa ou não o teto constitucional. Nem por isso ele concorda com os valores discutidos. “Ouso ponderar que o valor bruto atual do subsídio de Ministro de Estado (R$ 26.723,13) não parece ser adequado à natureza e complexidade das funções desenvolvidas.”
Questão maior
Walcher reconhece a profundidade da discussão. Na sentença, ele analisa que, depois da reforma constitucional de 1998 a eficiência na administração pública passou a ser obrigação constitucional do Estado. Isso obrigou os administradores a profissionalizar a gestão, só que não foram criados meios de equiparar a remuneração à exigência, no entendimento do juiz.
Na decisão, ele afirma que o sistema de remuneração por subsídio único foi criada para melhor administrar o pagamento dos funcionários públicos. Mas, na visão dele, foi ruim para a administração pública.
“É fácil perceber a dificuldade que o gestor público passou a ter, no regime de subsídio, para valorizar e motivar seus colaboradores”, escreve. “Nela, o colaborador de longo tempo percebe o mesmo valor do que entrou na organização no dia anterior; aquele de alto desempenho percebe o mesmo valor daquele que apresenta baixo desempenho; e o que investe seu tempo pessoal em capacitação ganha o mesmo montante daquele que parou de estudar e de evoluir.”
Sentido estrito e sentido amplo
No entanto, a Constituição, no artigo 37, inciso XVI, “veda a acumulação remunerada de cargos públicos”. Por isso o juiz passa a discutir o que é função pública.
Em sentido estrito, afirma o juiz, função pública é uma “unidade de atribuições” criada por lei e só pode ser exercida por detentor de cargo público. Em sentido amplo, “é a unidade de atribuições exercida por qualquer espécie de agente público”.
No entendimento de Walcher, o artigo 37 da Constituição se refere ao sentido amplo da expressão. “Isso significa, portanto, que nossa Constituição veda a acumulação remunerada de cargo e emprego públicos com qualquer outra função pública 'lato sensu', inclusive aquelas que podem ser exercidas por particulares.”
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Ação Popular 5003643-37.2012.404.7104
Veja anexo os ministros e ex-ministros que deixarão de receber jeton:
Fonte: ConJur